Acórdão nº 01064/18.6BEBRG-A.S1 de Tribunal dos Conflitos, 05 de Maio de 2021

Magistrado ResponsávelMARIA DOS PRAZERES PIZARRO BELEZA
Data da Resolução05 de Maio de 2021
EmissorTribunal dos Conflitos

TRIBUNAL DOS CONFLITOS Acordam, no Tribunal dos Conflitos: 1. AA instaurou contra o Município de Barcelos, no Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, uma «ação administrativa de condenação à prática de atos administrativos devidos, nos termos da lei ou de vínculo contratualmente assumido», pedindo que fosse declarado ilícito o seu despedimento (artigo 38.º do Código do Trabalho) e que o réu fosse condenado na sua reintegração (artigo 389.º do Código do Trabalho), no pagamento das “retribuições que deixou de auferir desde Fevereiro de 2017 até ao trânsito em julgado da sentença” (n.º 1 do artigo 390.º do Código do Trabalho), sem prejuízo do disposto no art. 98.º-N, n.ºs 1 a 3, do CPT, que neste momento computa no valor de 7 322,00€” e de uma indemnização de € 3 000,00 por danos não patrimoniais, por violação do direito à ocupação efectiva (al. b) do n.º 1 do artigo 129.º do Código do Trabalho).

Para o efeito, e em síntese, alegou ter celebrado com o réu, em 31 de Agosto de 2015 e em 31 de Janeiro de 2017 (docs. 1 e 2 juntos com a petição inicial), dois contratos de emprego-inserção +, “no âmbito da medida contrato Emprego – inserção +, cujos destinatários são os desempregados beneficiários do rendimento social de inserção e outros desempregados elegíveis”, “para prestar trabalho socialmente necessário na área de limpeza e conservação dos espaços públicos”; ter recebido uma comunicação do réu, datada de 8 de Fevereiro de 2017, a fazer cessar o contrato, invocando a al. b) do n.º 4 da cláusula 7.ª (“faltar injustificadamente durante cinco dias consecutivos ou dias interpolados”); mas nunca ter faltado injustificadamente, limitando-se a aguardar indicações em casa, conforme lhe ordenou o réu.

O réu contestou. Por entre o mais, veio dizer que “os ‘Contratos emprego-inserção +’ criados pela Portaria 128/2009, de 30 de Janeiro, nunca poderiam criar uma relação de trabalho e muito menos de emprego público”.

O autor replicou.

Findos os articulados, por decisão de 23 de Outubro de 2019 o Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga julgou-se materialmente incompetente e absolveu o réu da instância, por entender que resulta da análise do pedido e da causa de pedir que o autor estruturou “o presente litígio como emergente de uma relação laboral entre si e o réu Município, configurando a actuação deste como um ‘despedimento ilícito’ e peticionando a sua reintegração, o pagamento das ‘retribuições que deixou de auferir’ e dos danos morais daí resultantes”, cabendo aos tribunais judiciais a respectiva apreciação. Invocou ainda a jurisprudência do Tribunal dos Conflitos que atribuiu aos tribunais judiciais a competência para conhecer de pedidos de reparação causados por acidentes ocorridos no âmbito de contratos como os que aqui estão em causa.

Na sequência de requerimento do autor, em 3 de Dezembro de 2019, o Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga proferiu despacho a remeter o processo ao Juízo do Trabalho de Barcelos.

Este Tribunal (Juiz …), todavia, por decisão de 16 de Dezembro de 2019, julgou-se absolutamente incompetente para conhecer da presente ação e absolveu da instância o réu Município de Barcelos.

Para tanto, sustentou, em suma, que o contrato celebrado entre as partes não é fonte de qualquer relação jurídico-laboral ou de emprego, concretizando que “O que há é – salvo sempre o devido respeito por melhor entendimento – uma relação contratual que não é subsumível a uma relação laboral (seja de emprego público ou privado) e, nessa medida, a competência para a sua apreciação cabe na competência residual da jurisdição cível”.

Inconformado, o autor apelou para a Secção Social do Tribunal da Relação de Guimarães, que, defendendo que “o "trabalho socialmente necessário" tem um enquadramento jurídico próprio, no âmbito da protecção social no desemprego, que nada tem a ver com o estabelecido no Código do Trabalho para o contrato de trabalho ou equiparado”, por acórdão de 25 de Junho de 2020 confirmou a decisão do Juízo do Trabalho de Barcelos – Juiz 1.

Este acórdão veio todavia a ser revogado pelo acórdão de 16 de Dezembro de 2020 do Supremo Tribunal de Justiça, disponível em www.dgsi.pt, que julgou que o litígio dos autos se insere na competência dos Tribunais Administrativos e Fiscais, sendo os tribunais judiciais materialmente incompetentes. Consequentemente, absolveu o réu da instância, nos termos do n.º 1 do artigo 99.º do Código de Processo Civil, e considerou prejudicada a questão de saber se, dentro dos tribunais judiciais, a causa se incluía na competência dos tribunais cíveis ou dos tribunais de trabalho.

Em breve síntese, o Supremo Tribunal de Justiça considerou que «os contratos de “emprego inserção” e de “emprego-inserção +” disciplinados na Portaria n.º 128/2009, de 30 de Janeiro, titulam as relações jurídicas entre a entidade promotora – no caso dos autos o Município Réu – e o trabalhador e enquadram a prestação de trabalho levada a cabo, com a definição do complexo de direitos e obrigações das partes.

(…) É líquido que o regime de cessação do contrato de trabalho emergente dos artigos 338.º e ss. do Código de Trabalho nada tem a ver com estes contratos, o que é questão completamente diversa do enquadramento jurídico do acidente de trabalho ocorrido na sua execução, matéria a que se refere o acórdão dos Tribunal dos Conflitos proferido no referido processo n.º 015/17, de 19 de outubro de 2017, e outra jurisprudência daquele Tribunal invocada nos autos. O que se torna evidente é que os contratos em causa, face ao regime que resulta da mencionada Portaria e dos regulamentos emitidos pelo Instituto de Emprego e Formação Profissional, nos termos do seu artigo 17.º, titulam relações jurídicas enquadradas pelo Direito Administrativo, que por tal motivo devem ser consideradas como relações jurídicas administrativas, o que implica que os litígios emergentes dos mesmos se insiram no âmbito da competência dos Tribunais Administrativos, tal como já resultava do acórdão desta Secção de 14 de novembro de 2001, no que se refere aos acordos de atividade ocupacional».

2. O Juiz .. Juízo do Trabalho de Barcelos suscitou junto do Presidente do Supremo Tribunal de Justiça a resolução do conflito negativo de jurisdição.

Determinado pelo Presidente do Supremo Tribunal de Justiça que se seguisse a tramitação prevista na Lei n.º 91/2019, de 4 de Setembro (Tribunal dos Conflitos), o Ministério Público proferiu parecer, nos termos do n.º 4 do respectivo artigo 11.º, no sentido de caber à jurisdição administrativa a apreciação da acção, concretamente ao Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga.

3. Os factos relevantes para a decisão do conflito constam do relatório.

Está apenas em causa determinar quais são os tribunais competentes para apreciar o pedido do autor, se os tribunais judiciais – nos quais se integram os tribunais do trabalho e que, no conjunto do sistema judiciário, têm competência residual (n.º 1 do artigo 211º da Constituição e n.º 1 do...

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