Acórdão nº 046/17 de Tribunal dos Conflitos, 08 de Fevereiro de 2018
Magistrado Responsável | ANA PAULA PORTELA |
Data da Resolução | 08 de Fevereiro de 2018 |
Emissor | Tribunal dos Conflitos |
Acordam, em conferência, no Tribunal dos Conflitos RELATÓRIO 1. A……… e OUTROS intentaram no Tribunal Judicial de Amarante, acção com processo sumário, que correu termos sob o processo nº 1399/12.1TBAMT contra Auto-Estrada do Marão, SA, InfraTúnel- Construtores do Túnel do Marão, ACE e B……… Lda.
Os AA. Interpuseram uma acção contra a entidade expropriante e o consórcio construtor da parcela 73 destacada do seu prédio e parcela 76.1 a destacar de um prédio rústico onde se encontra um caminho de servidão para o seu prédio, caminho esse que foi expropriado em 300 metros.
Para tanto alegam que durante o decurso das obras o consórcio construtor ocupou o caminho de forma a que ele deixou de poder ser utilizado para dar acesso à parte sul do seu prédio, restringindo o pleno gozo dos AA daquela parte do seu prédio.
E que, desde que o caminho foi cortado em finais de 2009 sofreram imensos prejuízos.
Em suma, pretendem ser aqui ressarcidos dos danos relativos à falta de acesso ao seu prédio na sequência da expropriação de duas parcelas de terreno, uma que lhes pertence e que foi dividida em duas partes, e outra pertencente a um terceiro, na qual se encontrava parcialmente implantada a servidão de passagem cujo reconhecimento peticionam na alínea b) do petitório e que também terá sido alvo de parcial expropriação.
E, em sede de pedido, requerem a condenação das Rés a; “a)- Reconhecer que os A. são donos e legítimos possuidores do prédio identificado no art. 1º da Petição Inicial; b) - Reconhecer a favor do prédio dos A.A. uma servidão de passagem no local por eles assinalado nas plantas juntas como D/4 e D/5, de forma a permitir o acesso de pessoas e veículos, nomeadamente agrícolas, nos termos em que se verificou até cerca de 3 anos antes e desde tempos imemoriais até há cerca de 3 anos; c)- Reconhecer que a parte sul do prédio dos A, resultante das obras empreendidas pelas R. nas parcelas 73 e 76, se encontra encravada; d)- Reconhecer que, com as mesmas obras, as R impediram os A de uso e acesso e de fruir e dispor do seu prédio, assim violando o seu direito de propriedade; e)- A pagar-lhes a quantia de 3000 euros , a título de indemnização pelos prejuízos sofridos pelos A desde que foi cortado o acesso até à presente data, na actividade agrícola por eles desenvolvida no mesmo prédio, em consequência da privação absoluta do seu direito, durante esse período; f)1- Em caso de reconstituição natural: A realizar as obras necessárias à sua restituição aos autores do pleno uso, fruição e disposição do prédio, criando novo acesso e viabilizando o trânsito de pessoas e veículos pelo mesmo; 2- Caso se entenda que a reconstituição natural não é possível: Serem as R condenadas a pagar indemnização, nos termos do art. 566º CC, a liquidar em execução de sentença; g) - Reparar os danos patrimoniais que vierem a ocorrer, a liquidar em execução de sentença; h)...reparação dos danos morais no valor de 3000 euros; presentes e futuros; i)...danos morais que lhes venham a causar e que se vierem a liquidar em execução de sentença j)... juros moratórios vencidos e vincendos ...
k)... custas de parte e procuradoria.” 2. Por decisão de 15-02-2013, foi declarada a incompetência absoluta em razão da matéria do tribunal, por ser competente a Jurisdição Administrativa, tendo os RR sido absolvidos da instância, decisão que foi confirmada, em sede de recurso interposto pelos AA para o Tribunal da Relação do Porto.
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Os A. requereram então a remessa ao TAF de Penafiel (fls. 1026), que decidiu, , em 30.1.2017, ser materialmente incompetente para conhecer dos pedidos formulados na acção.
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Os AA interpuseram recurso para este Tribunal de Conflito, que foi admitido.
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O EMMP emitiu parecer no sentido do presente conflito ser resolvido com a atribuição da competência à jurisdição administrativa (fls. 1187/9).
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Sem vistos, mas com distribuição prévia do projeto de acórdão, cumpre decidir.
* FACTUALIDADE A CONSIDERAR A factualidade relevante para a resolução do conflito aqui em causa é a que resulta dos autos e supra referida em sede de relatório.
* O DIREITO Estamos, no caso sub judice, perante um conflito de jurisdição negativo já que dois tribunais, integrados em ordens jurisdicionais diferentes, declinam o poder de conhecer a mesma questão, decisões que já não são susceptíveis de recurso (cfr. n°s 1 e 3 do art.º 109° do CPC).
O Tribunal de Conflitos tem competência para dirimir os conflitos de jurisdição em que intervenham tribunais judiciais se, no outro polo, estiverem tribunais administrativos e fiscais.
Na verdade, tal como resulta do Dec. Lei 40.768 de 8/9/56 que veio atribuir competência ao Supremo Tribunal Administrativo para conhecer dos conflitos entre as autoridades administrativas e os tribunais administrativos, ficaram desde então reservados ao Tribunal de Conflitos competência exclusiva para os conflitos de jurisdição entre “autoridades administrativas e judiciais”.
Como se diz no Acórdão deste Tribunal de Conflitos, de 20.01.2010, Proc. n° 026/09: “...Os conflitos deste tipo são resolvidos, ou pelo STJ, ou pelo Tribunal dos Conflitos, «conforme os casos» (art. 116º, n.º 1, do CPC). É de notar que a competência do STJ para resolver conflitos de jurisdição é residual – pois o STJ só conhece «dos conflitos de jurisdição cuja apreciação não pertença ao tribunal de conflitos» (cfr. o art. 36º, al. d), da Lei n.º 3/99). Sendo assim, há primacialmente que ver se a resolução do presente conflito de jurisdição incumbe ao Tribunal dos Conflitos; e, se dissermos que não, concluiremos que o conflito dos autos terá de ser solucionado pelo STJ.
A antiga redacção da al. d) do art. 72º do CPC evidenciava os «casos» a resolver pelo Tribunal dos Conflitos: tratava-se dos conflitos de jurisdição suscitados «entre as autoridades e tribunais administrativos e entre aquelas ou estes últimos e os tribunais judiciais». É certo que esta redação se encontra revogada; mas o seu sentido normativo subsiste ainda, íntegro, noutros dispositivos delimitadores do âmbito de competência do Tribunal dos Conflitos.
Com efeito, já o Decreto n.º 18.017, de 28/2/1930, previra que, «no julgamento dos conflitos de jurisdição entre autoridades administrativas e judiciais», interviessem cinco juízes do STJ e os membros do Supremo Conselho de Administração Pública – o qual antecedeu o STA. Estava aí em esboço o futuro Tribunal dos Conflitos, que o Regulamento aprovado pelo Decreto n.º 19.243, de 16/1/1931, mais tarde criou a fim de solucionar «conflitos positivos ou negativos de jurisdição e competência entre as autoridades administrativas e judiciais» (cfr. o art. 59º desse diploma). E a mesma ideia persistiu no DL n.º 23.185, de 30/10/1933, que criou o STA e cujo art. 17º estabeleceu a actual composição do Tribunal dos Conflitos. Ora, a composição bipartida deste tribunal logo sugere que...
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