Acórdão nº 03/18 de Tribunal dos Conflitos, 05 de Julho de 2018
Magistrado Responsável | COSTA REIS |
Data da Resolução | 05 de Julho de 2018 |
Emissor | Tribunal dos Conflitos |
Acordam no Tribunal de Conflitos: 1.
A Caixa de Previdência dos Advogados e Solicitadores (doravante CPAS) intentou, nos juízos de execução de Lisboa, contra A………………, acção executiva para cobrar a quantia de € 86.016,13, acrescida dos juros moratórios vincendos sobre o valor das contribuições em dívida, apresentando como título executivo a certidão de dívida emitida pela Direcção daquela Caixa.
Aquele Tribunal declarou-se materialmente incompetente para julgar o pedido formulado naquele requerimento, tendo absolvido o executado da instância.
A CPAS interpôs recurso para o Tribunal da Relação de Lisboa mas este, por acórdão de 2/11/2017, negou-lhe provimento confirmando decisão recorrida.
A CPAS interpôs, então, ao abrigo do art.º 101.º, n.º 2, do CPC, recurso para este Tribunal de Conflitos tendo, na respectiva alegação, formulado as seguintes conclusões: 1.
Vem o presente recurso para o Tribunal dos Conflitos do acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa que confirmou a decisão de primeira instância que indeferiu liminarmente a presente acção executiva, pelo facto de ter julgado o tribunal judicial como materialmente incompetente para a decisão e tramitação deste processo executivo.
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O presente recurso é interposto nos termos do disposto no art.º 101.º, n.º 2, do CPC, uma vez que, tendo o Tribunal da Relação de Lisboa julgado incompetente o tribunal judicial para dirimir e tramitar a presente acção executiva, pelo facto de a mesma «pertencer ao âmbito da jurisdição administrativa e fiscal, o recurso destinado a fixar o tribunal competente é interposto para o Tribunal de Conflitos».
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O tribunal competente em razão da matéria, para julgar e tramitar a acção executiva proposta pela CPAS para cobrar as contribuições devidas pelo Beneficiário A……………. é o tribunal judicial da comarca de Lisboa Norte – Juízo de Execução de Loures Juiz 3 pelo que a decisão do Tribunal da Relação de Lisboa, deveria ter sido outra.
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Julgando o tribunal judicial como materialmente competente, porquanto a decisão não tomou em conta as particularidades da natureza e regime jurídico da própria CPAS.
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Por outro lado, o acórdão recorrido, não levou em devida conta a comunicação da Autoridade Tributária e Aduaneira (AT), em que esta entidade se mostrou indisponível para propor os processos executivos para cobrança das contribuições em dívida à CPAS, por falta de norma habilitante para o efeito.
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A CPAS, não obstante prosseguir fins de interesse público, tem uma forte componente privatística. Com efeito.
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A CPAS «é uma instituição de previdência autónoma, com personalidade jurídica, regime próprio e gestão privativa…» (cf. art.º 1.º, n.º 1, do regulamento aprovado pelo DL n.º 119/2015, de 29/6) não fazendo parte do sistema público de segurança social (cf. Ilídio das Neves in “Direito da Segurança Social – Princípios Fundamentais Numa Análise Prospectiva”).
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A CPAS não está sujeita a um poder de superintendência do Governo, mas a um mero poder de tutela (cf. art.º 97.º do regulamento aprovado pelo DL n.º 119/2015, de 29/6), sendo essa tutela meramente inspectiva.
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A CPAS não faz parte da administração directa ou indirecta do Estado.
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Os seus membros directivos não são designados pelo Governo, mas eleitos «pelas assembleias dos advogados e dos associados da Câmara dos Solicitadores».
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Mas além disso, a CPAS não é financiada com dinheiros públicos, sejam oriundos do Orçamento do Estado ou do Orçamento da Segurança Social.
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Pelo que a CPAS não deve ser qualificada como uma “mera pessoa colectiva de direito público”, mas antes como uma entidade (“sui generis”) de natureza mista.
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Por outro lado, as contribuições para a CPAS não têm natureza tributária, mais se assemelhando a contribuições para um fundo de pensões.
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De facto as contribuições para a CPAS assentam numa verdadeira relação sinalagmática entre o montante das contribuições pagas e a futura pensão de reforma a ser percebida pelo beneficiário.
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A este facto acresce que, nos termos do disposto no art.º 80.º, n.º 4, do regulamento aprovado pelo DL n.º 119/2015, o montante das contribuições depende em exclusivo da opção e, portanto, da única vontade do beneficiário.
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O que não sucede com as quotizações dos trabalhadores (por conta de outrem e por conta própria) para a Segurança Social que estão directamente dependentes da remuneração auferida e rendimento obtido.
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O acórdão recorrido entendeu que «as relações jurídicas estabelecidas entre a CPAS e os seus associados são relações de natureza administrativa e cabem na competência geral mencionada na referida al.ª o) do n.º 1 do art.º 4.º do ETAF.» 18.
Todavia, em face da natureza e regime pelo qual se rege a CPAS e tendo, igualmente, em atenção a natureza das contribuições, questiona-se se as relações entre a CPAS e os seus beneficiários serão, efectivamente, «relações de natureza administrativa» para o efeito do disposto na alínea o) do n.º 1 do art.. 4.º do ETAF.
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Pelo que, tendo a CPAS uma natureza mista, questiona-se se as relações entre a Caixa e os seus beneficiários poderão, simplesmente, ser qualificadas como tendo «natureza administrativa».
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E, desse modo, considerar excessivo qualificar as relações jurídicas entre a CPAS e os seus beneficiários como sendo de «natureza jurídica administrativa» para efeitos da competência atribuída pela nova al.ª o) do n.º 1 do art.º 42 do ETAF aos...
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