Acórdão nº 028/15 de Tribunal dos Conflitos, 18 de Fevereiro de 2016
Magistrado Responsável | SOUTO MOURA |
Data da Resolução | 18 de Fevereiro de 2016 |
Emissor | Tribunal dos Conflitos |
O Mº Pº junto do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra veio requerer a resolução do conflito negativo de jurisdição entre este Tribunal e a 1ª Secção de Trabalho — J8, da Comarca de Lisboa, Instância Central, ao abrigo dos arts. 109º, 110º e 111º, nº 2 e 3 do CPC.
A – O PEDIDO São os seguintes os fundamentos do pedido (transcrição): “1- A douta sentença proferida nos autos em 25.03.2015, já transitada em julgado, considerou serem os tribunais administrativos incompetentes em razão da matéria para decretar a presente providência cautelar, e que tal competência cabe aos Tribunais de Comarca, Instância Cível, Secção de Trabalho, nos termos do disposto no artigo 126°, n.º 1, alínea b) da Lei nº 62/2103, de 26 de Agosto - Lei de Organização do Sistema Judiciário.
2- Por sua vez, o despacho de indeferimento liminar proferido em 10.12.2014, no Procedimento Cautelar Comum intentado pela requerente, com o n.º 12513/14.2T8LSB, da 1ª Secção de Trabalho - J8, da Comarca de Lisboa, Instância Central, transitado em julgado em 05.01.2015, conforme certidão que ora se junta (e que não constava dos autos), considerou ser a Secção de Trabalho incompetente em razão da matéria e competente a jurisdição administrativa para conhecer do presente pedido cautelar.
3- Verifica-se, pois, existir conflito negativo de jurisdição, uma vez que dois tribunais, integrados em ordens jurisdicionais diferentes, declinam o poder de conhecer da mesma questão -cfr. artº 109°, n.º 1 e 3, do CPC.
4- O Ministério Público tem legitimidade para suscitar a resolução do presente conflito, nos termos do disposto no art.º 111º, n.º 2, do CPC.
5- O presente processo tem caráter urgente e corre nos próprios autos - art.º 111º, nº 3 CPC.
Nestes termos, requer-se a V. Exa., que, após a subida dos autos, seja proferida decisão de resolução do presente conflito”.
B – CONFIGURAÇÃO DO CONFLITO A………………, portuguesa, solteira, nascida em 15-10-1992, titular do CC com o nº ………. e com o NIF …………., residente na Rua …………., n.º ……, 2740-……, …………. — Oeiras, requereu junto da 1ª Secção do Trabalho da Instância Central da Comarca de Lisboa, procedimento cautelar comum (providência cautelar não especificada), como preliminar de ação declarativa comum, de condenação, a intentar posteriormente contra a requerida, “NAV PORTUGAL, E.P.E.”, entidade pública empresarial, com o número único de matrícula e de identificação fiscal 504.448.064 e sede em Lisboa, na Rua D — Edifício 121 - do Aeroporto Internacional de Lisboa, 1700-008 LISBOA, (doravante NAV). Os fundamentos foram os seguintes: “I – O ESTATUTO DA NAV 1.º A NAV tem a natureza de entidade pública empresarial (E.P.E), o que significa que, à face da lei vigente (Decreto-Lei n.º 133/2013, de 3 de Outubro), pertence à chamada administração pública indirecta e é considerada uma empresa pública, integrando o sector público empresarial — cfr. artigos 2º, 7º, e 13º do Decreto-Lei n.º 133/2013.
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Porque assim, a NAV está obrigada a cumprir o disposto no artigo 47º do citado Decreto-Lei n.º 133/2013, relativo a “Padrões de ética e conduta”, cabendo-lhe, nomeadamente (n.º 1 do preceito), a adopção de “um código de ética que contemple exigentes comportamentos éticos e deontológicos”.
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Segundo estabelece o n.º 2 desse artigo 47º, deve tratar “com equidade todos os seus clientes e fornecedores e demais titulares de interesses legítimos” e, designadamente e “de um modo geral, qualquer entidade que estabeleça alguma relação jurídica com a empresa”.
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Por outro lado, também se aplicam à NAV os 10 Princípios da Administração constantes da CARTA ÉTICA DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA, entre os quais é pertinente enfatizar aqui: O Princípio da Justiça e da Imparcialidade, que impõe o tratamento de todos os cidadãos “de forma justa e imparcial” e “segundo rigorosos princípios de neutralidade” e O Princípio da Colaboração e da Boa Fé, que impõe a colaboração com os cidadãos, “segundo o princípio da boa fé, tendo em vista a realização do interesse da comunidade e fomentar a sua participação na realização da actividade administrativa”, tratamento segundo o mesmo princípio de todos os cidadãos “de forma justa e imparcial” e “segundo rigorosos princípios de neutralidade”.
II – O PROCEDIMENTO CONCURSAL ORA EM CAUSA (CONCURSO PARA CONTROLADOR DE TRÁFEGO AÉREO) 5.º A NAV decidiu abrir, abriu e anunciou um Concurso Para Controlador de Tráfego Aéreo (CTA) a que atribuiu a referência — 01/FORMA/2014 CONTROLADOR DE TRÁFEGO AÉREO (m/f).
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Nesse contexto, inseriu no sítio da Empresa na Internet o Anúncio cuja cópia se junta (DOC. 1), o qual teve também divulgação, via Internet, no sítio Pista 73, conforme cópia que igualmente se anexa (DOC. 2).
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No aludido sítio da NAV foi publicada, na secção BOAS NOTÍCIAS, uma notícia (contendo calendário de candidaturas e de entrega de documentação pelos candidatos, calendário esse que veio a ser diferente no plano dos factos) cuja cópia outrossim se anexa (DOC. 3).
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Nela se dava conta ao público em geral de que a NAV queria recrutar 18 controladores de tráfego aéreo, explicando-se que: Os candidatos seriam alvo de uma pré-selecção antes de integrarem o curso de formação que dá acesso à licença; Uma licenciatura, idade máxima de 25 anos, domínio das línguas inglesas e uma prova de acuidade visual eram as condições mínimas para concorrer às aludidas 18 vagas de controlador aéreo.
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A citada notícia finalizava dizendo que “ainda que os requisitos de candidatura não sejam muito exigentes, B…………, responsável de recrutamento da NAV, explicou nas Boas Notícias que o mais difícil para os candidatos será superar as provas que se seguem”.
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De todo o modo, e pela sua hipotética conexão (na realidade inexistente como adiante se dirá) com o caso em apreço neste requerimento, transcrevem-se seguidamente as duas únicas Notas incluídas no Anúncio mencionado no artigo 6.º deste requerimento inicial: “Nota 1: Candidatos de concursos anteriores só serão admitidos caso tenham sido considerados “aptos” na prova de FEAST WEB E FEAST DART.
Nota 2: Não são admitidos candidatos de anterior concurso considerados “não aptos” na prova de Avaliação Comportamental”, desde que a mesma tenha sido realizada há menos de 12 meses.” 11.º A Requerente candidatou-se e foi admitida ao concurso referido nos artigos antecedentes deste articulado.
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Tendo sido iniciadas as provas de pré-selecção do concurso em causa, a Requerente apresentou-se no local, dia e hora designados pela NAV para prestar provas, isto no dia 25 de Setembro de 2014.
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Antes mesmo do sucedido nesse dia de teste, e no âmbito do concurso externo em apreço, chegaram aos ouvidos da Requerente alguns rumores segundo os quais não poderiam ser aceites a realizar as provas previstas no Concurso os candidatos que já tivessem realizado no Estrangeiro (designadamente na Holanda) o conjunto de testes apelidado de FEAST.
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Tendo sido solicitado um parecer a esse respeito à sociedade de advogados do signatário, foi este emitido com data de 16 de Setembro de 2014, dele se juntando agora uma cópia (DOC. 4).
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As conclusões desse parecer foram no sentido de que: seria ilegal a eventual exclusão do concurso da ora Requerente com a invocação, como “fundamento” para essa exclusão, do resultado de teste anterior; a NAV (e, eventualmente, quem em seu nome adoptasse uma interpretação claramente ilegal e determinante da exclusão da Requerente no nosso concurso em apreço) tornar-se-ia civilmente responsável pelos prejuízos que sofrerá a ora Requerente.
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Ainda antes do dia de teste a que já se fez menção (25 de Setembro) os Serviços, designadamente da Área do Recrutamento e sua Direcção, tomaram conhecimento do conteúdo e das conclusões do parecer referido nos dois artigos antecedentes. Contudo, 17.º Aqueles Serviços recusaram receber esse parecer, que para o efeito lhes foi apresentado, e não fizeram caso do que no parecer se continha, tal como não vieram a fazer da correspondência remetida à NAV que adiante é referida.
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No dia 25 de Setembro passado, estando a ora Requerente e outros concorrentes em vias de iniciar os testes a realizar nesse dia, e já presentes nas instalações onde decorreriam os testes, a Requerente foi abordada pelo Presidente do Júri do concurso, que indagou se ela autorizava que a NAV PORTUGAL obtivesse os resultados da prova por ela realizada no EUROCONTROL.
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Neste contexto, a Requerente interrogou o Presidente do Júri sobre se, caso ela desse essa autorização, lhe seria permitida a permanência no concurso e a realização dos testes.
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A resposta que teve foi frontal e firmemente negativa.
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Posta perante tal resposta, e como parece inteiramente lógico, a Requerente recusou dar a autorização dela solicitada, o que motivou o lançamento da nota (referindo testemunhas) cuja cópia se junta (DOC. 5).
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Nesse dia (25 de Setembro) e ocasião, a Requerente logo solicitou aos responsáveis presentes da NAV que lhe fosse definida por escrito a posição da NAV PORTUGAL e sua fundamentação, sendo que isso lhe foi recusado, nada lhe tendo sido entregue ou enviado, por escrito ou outra via, nesse dia ou posteriormente.
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Quer dizer: a NAV entendeu consignar por escrito a menção da recusa de autorização da Requerente, mas fugiu duradouramente a exprimir de modo escrito a posição de exclusão da realização dos testes pela Requerente com base na realização da prova de Maastricht, bem como a fundamentação dessa posição, 24.º Tal como se esquivou o representante da NAV PORTUGAL a reduzir a escrito a comunicação de que, autorizasse ou não a Requerente a obtenção dos resultados da mencionada prova da Holanda, não seria admitida a realizar os referidos testes.
III – O DIREITO APLICÁVEL E VIOLADO PELA NAV 25.º Não pode sustentar-se, ex adverso, que os concorrentes do concurso em apreço, sendo este de recrutamento, não têm ainda uma relação jurídica com a NAV, o que supostamente justificaria a não aplicação do n.º 2, parte final, do citado (no artigo 2.º desta petição) artigo 47º do Decreto-Lei n.º...
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