Acórdão nº 036/17 de Tribunal dos Conflitos, 15 de Março de 2018
Magistrado Responsável | ANA PAULA PORTELA |
Data da Resolução | 15 de Março de 2018 |
Emissor | Tribunal dos Conflitos |
Acordam, em conferência, no Tribunal dos Conflitos RELATÓRIO 1. A……………… moveu contra a Administração Central do Sistema de Saúde, I.P., Centro Hospitalar de Trás-os-Montes e Alto Douro, EPE e Administração Regional de Saúde do Norte, IP, acção declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, requerendo a condenação das RR: "a) A reconhecer ao autor o direito à manutenção do acesso à parte sobrante do prédio expropriado pela rotunda utilizada pelos ramais do IP3 e EN226; b) A construírem o acesso à parte sobrante do prédio expropriado pela rotunda utilizada pelos ramais do IP3 e EN226; Subsidiariamente, c) A pagar ao autor a quantia de €1.738.20,08, a título de indemnização pelos prejuízos sofridos com a depreciação da parcela que identifica no art. 1°. atualizada à data da decisão final do processo expropriativo de acordo com a evolução do índice de preços no consumidor, acrescida de juros de mora à taxa legal até efetivo e integral pagamento.
d) Caso não se entenda que o montante indemnizatório deve ser atualizado nos termos da alínea anterior, pede a condenação das rés no pagamento da quantia correspondente ao valor de juros de depósito bancário a prazo sobre a quantia de € 1.738.20,08, até efetivo e integral pagamento para ressarcimento integral dos prejuízos sofridos pelo expropriado/autor, a liquidar em sede de execução de sentença." Fundamentou tais pedidos na declaração de utilidade pública, com carácter de urgência, e expropriação de uma sua parcela de terreno, com a área de 98.400 m2, do seu prédio rústico designado por ………….., necessária à construção do "Novo Hospital Distrital de Lamego", sendo expropriante a extinta Direcção-Geral das Instalações e Equipamentos de Saúde, ora integrada na Administração Central do Sistema de Saúde, I.P.
E que, no âmbito da construção da nova via rodoviária que divide o seu prédio em duas partes foi ocupado um caminho de servidão impossibilitando a passagem de pessoas e veículos pelo que ficaram privados de qualquer acesso à parte Sul do seu prédio.
Daí que requeiram aos réus a construção de um acesso à parte sobrante do seu prédio, como se haviam comprometido no âmbito da expropriação a que foram sujeitos, e subsidiariamente indemnização pela depreciação da mesma parte sobrante já que o Tribunal da Relação do Porto considerou inexistir efectiva depreciação da mesma (parcela sobrante], tendo fixado o valor da indemnização devida pela expropriação no montante de 3.746.518,80 €. que, a seu ver, não é o correcto.
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O Tribunal Judicial de Viseu, por decisão de 13.2.2015, julgou-se materialmente incompetente para conhecer da acção declarativa de condenação com processo comum por serem os tribunais administrativos os competentes (art.4º, nº1, alínea i) ETAF), por respeitar a questão de responsabilidade civil extracontratual das RR, que integram a administração estadual indirecta privada.
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O TAF de Viseu declarou também a sua incompetência material, para conhecer da acção, com fundamento no facto de o pedido do A. consistir no cumprimento de prestação de facto das RR, no âmbito do processo expropriativo (reposição do acesso à parcela sobrante ou justa indemnização pela sua depreciação).
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Face ao exposto o Ministério Público vem requerer a Resolução do Conflito Negativo de Jurisdição entre o Tribunal da Comarca de Viseu - Inst. Central - Secção Cível, e o Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu.
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Sem vistos, mas com distribuição prévia do projeto de acórdão, cumpre decidir * FACTUALlDADE A CONSIDERAR A factualidade relevante para a resolução do conflito aqui em causa é a que resulta dos autos e supra referida em sede de relatório.
* O DIREITO Estamos, no caso sub judice, perante um conflito de jurisdição negativo já que dois tribunais, integrados em ordens jurisdicionais diferentes, declinam o poder de conhecer a mesma questão, decisões que já não são susceptíveis de recurso (cfr. nºs 1 e 3 do art.º 109º do CPC).
O Tribunal de Conflitos tem competência para dirimir os conflitos de jurisdição em que intervenham tribunais judiciais se, no outro polo, estiverem tribunais administrativos e fiscais.
Na verdade, tal como resulta do Dec. Lei 40.768 de 8/9/56 que veio atribuir competência ao Supremo Tribunal Administrativo para conhecer dos conflitos entre as autoridades administrativas e os tribunais administrativos, ficaram desde então reservados ao Tribunal de Conflitos competência exclusiva para os conflitos de jurisdição entre "autoridades administrativas e judiciais".
Como se diz no Acórdão deste Tribunal de Conflitos, de 20.01.2010, Proc. nº 026/09: “… Os conflitos deste tipo são resolvidos, ou pelo STJ, ou pelo Tribunal dos Conflitos, «conforme os casos» (art. 116°, n.º 1, do CPC). É de notar que a competência do STJ para resolver conflitos de jurisdição é residual - pois o STJ só conhece «dos conflitos de jurisdição cuja apreciação não pertença ao tribunal de conflitos» (cfr. o art. 36°, aI. d), da Lei n.º 3/99). Sendo assim, há primacialmente que ver se a resolução do presente conflito de jurisdição incumbe ao Tribunal dos Conflitos; e, se dissermos que não, concluiremos que o conflito dos autos terá de ser solucionado pelo STJ.
A antiga redacção da aI. d) do art. 72° do CPC evidenciava os «casos» a resolver pelo Tribunal dos Conflitos tratava-se dos conflitos de jurisdição suscitados «entre as autoridades e tribunais administrativos e entre aquelas ou estes últimos e os tribunais judiciais». É certo que esta redação se encontra revogada; mas o seu sentido normativo subsiste ainda, integro, noutros dispositivos delimitadores do âmbito de competência do Tribunal dos Conflitos.
Com efeito, já o Decreto n.º 18.017, de 28/2/1930, previra que, «no julgamento dos conflitos de jurisdição entre autoridades administrativas e judiciais», interviessem cinco juízes do STJ e os membros do Supremo Conselho de Administração Pública - o qual antecedeu o STA. Estava aí em esboço o futuro Tribunal dos Conflitos, que o Regulamento aprovado pelo Decreto n.º 19.243, de 16/1/1931, mais tarde criou a fim de solucionar «conflitos positivos ou negativos de jurisdição e competência entre as autoridades administrativas e judiciais» (cfr. o art. 59º desse diploma). E a mesma ideia persistiu no DL n.º 23.185, de 30/10/1933, que criou o STA e cujo art. 17º estabeleceu a actual composição do Tribunal dos Conflitos. Ora, a composição bipartida deste tribunal logo sugere que ele se destina a clarificar uma precisa dúvida quanto ao «situs» onde devem conhecer-se os litígios - se na ordem dos tribunais judiciais, se na dos tribunais administrativos e fiscais ou no plano da pura Administração. Até porque, como se disse no acórdão do STJ de 18/11/2004 («in» CJ, 2004, tomo III, pág. 120), o art. 59º do Decreto n.º 19.243 deve ser actualmente interpretado por forma a ver-se, naquela sua referência às «autoridades administrativas», sobretudo a alusão aos juízes dos tribunais administrativos e fiscais.
É, aliás, significativo que a supressão da aI. d) do art. 72º do CPC nunca tenha levado este Tribunal dos Conflitos a vacilar quanto ao âmbito da sua competência, sempre definida, antes e depois da alteração legislativa, da mesma maneira -...
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