Acórdão nº 018/17 de Tribunal dos Conflitos, 01 de Fevereiro de 2018

Magistrado ResponsávelTERESA DE SOUSA
Data da Resolução01 de Fevereiro de 2018
EmissorTribunal dos Conflitos

Acordam no Tribunal dos Conflitos A…………, Lda, identificada nos autos, interpôs recurso de revista excepcional para o Supremo Tribunal de Justiça, do acórdão da Relação de Évora de 12.07.2016, com vista a ver determinada a seguinte questão: Se no domínio da vigência do Estatuto da Câmara dos Solicitadores aprovado pelo DL nº 88/2003 de 26 de Abril, alterado pela Lei nº 49/2004 de 24 de Agosto e nº 14/2006 de 26 de Abril e pelo DL nº 226/2008 de 20 de Novembro e demais legislação conexa, designadamente o Código Civil e o Código de Processo Civil, a responsabilidade civil extracontratual que aos Agentes de Execução for imputada no exercício das respectivas funções profissionais e por causa delas obedece ao regime geral da responsabilidade por factos ilícitos previsto no art. 483º e seguintes do Código Civil ou, em alternativa, ao Regime da Responsabilidade Civil do Estado e demais Entidades Públicas, prevista na Lei nº 67/2007 de 31 de Dezembro.

Nas alegações do presente recurso são formuladas as seguintes conclusões: 1) O presente recurso de Revista Excepcional tem em vista uma melhor aplicação do direito atenta a relevância jurídica das questões a seguir enunciadas e a análise sobre a invocada contradição de acórdãos sobre essas mesmas questões.

2) As questões que, pela sua relevância jurídica, importa analisar são as seguintes: 3) Se no domínio da vigência do Estatuto da Câmara dos Solicitadores aprovado pelo Decreto-Lei N° 88/2003 de 26 de Abril, alterado pela Leis N° 49/2004 de 24 de Agosto e Nº 14/2006 de 26 de Abril e pelo Decreto-Lei N° 226/2008 de 20 de Novembro, e demais legislação conexa a responsabilidade civil extracontratual que aos Agentes de Execução for imputada no exercício das respectivas funções profissionais e por causa delas obedece ao regime geral da responsabilidade por factos ilícitos previsto no artigo 483° e seguintes do Código Civil ou, em alternativa, ao Regime da Responsabilidade Civil do Estado e demais Entidades Públicas previsto na Lei N° 67/2007 de 31 de Dezembro, e consequentemente, 4) Se a competência para dirimir os pleitos relativos à responsabilidade civil extracontratual dos agentes de execução por actos ou omissões praticados no exercício das suas funções profissionais e por causa delas cabe aos Tribunais do Foro Comum ou aos Tribunais do Foro Administrativo.

5) Em Primeira Instância entendeu o Tribunal serem competentes para conhecer do mérito da presente acção os Tribunais do foro administrativo, estribando a sua fundamentação, no essencial, no disposto no artigo 162° do novo Estatuto da Ordem dos Solicitadores e dos Agentes de Execução aprovado pela Lei N° 154/2015 de 14 de Setembro.

6) Por sua vez, o douto Acórdão sob recurso, não obstante ter constatado ser "evidente que o Estatuto da Câmara dos Solicitadores a ter em conta na análise da questão em apreço, é o Estatuto da Câmara dos Solicitadores aprovado pela Lei 88/2003, de 26/04, com as subsequentes alterações que culminaram na 4a versão definida pelo Decreto-Lei n.º 266/2008, de 14/09"; 7) Decidiu no mesmo sentido da Primeira Instância, embora com fundamentação parcialmente diferente, sustentando que "as funções atribuídas ao Agente de Execução, no quadro do Estatuto da Câmara dos Solicitadores aprovado pela Lei 88/2003, de 26/04, com as subsequentes alterações (...), permitem-nos concluir que o Agente de Execução, enquanto auxiliar da justiça, exerce poderes de autoridade pública, no exercício das muitas funções de interesse público que lhe são acometidas pela lei processual, funções essas equiparadas a funções administrativas" concluindo "pela competência dos Tribunais Administrativos para dirimir as acções respeitantes à responsabilidade civil extracontratual dos agentes de execução, por actos e omissões praticados no âmbito da sua actividade processual como tal".

8) Este entendimento do Acórdão sob recurso está em contradição com o do Supremo Tribunal de Justiça ínsito nos Acórdãos deste Alto Tribunal proferidos em 06 de Julho de 2011 no Processo 85/08.1TJLSB.L1.S1 de que foi relator o Exmo. Senhor Juiz Conselheiro Fonseca Ramos e em 11 de Abril de 2013 no Processo N° 5548/09.9TVSNB.L1.S1 em que foi Relator o Exmo. Senhor Juiz Conselheiro Abrantes Geraldes.

9) Estes dois Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça, ambos proferidos no domínio da mesmíssima legislação aplicável aos presentes autos e sobre a mesma questão fundamental de direito, perfilham entendimento contrário, defendendo que as funções exercidas pelos Agentes de Execução têm uma matriz iminentemente privada e concluindo pela competência dos Tribunais do Foro Comum para dirimir os pleitos originados pelo exercício e por causa de tais funções.

10) A cuidada apreciação das questões jurídicas supra enunciadas na segunda e terceira conclusões é, atenta a contradição de acórdãos dos Tribunais Superiores sobre as mesmas questões de direito, no âmbito da mesma legislação, com iminente e inegável relevância jurídica, claramente necessária para uma melhor aplicação do direito neste e em outros processos judiciais, mormente por razões de segurança e certeza jurídicas.

11) Existe relevância jurídica necessária para uma melhor aplicação do direito quando se trate de uma questão cuja subsunção jurídica imponha um largo e importante debate pela doutrina e jurisprudência com o objectivo de se reunir um consenso em termos se servir de orientação, quer para as pessoas que possam ter interesse jurídico ou profissional na resolução de tal questão a fim de tomarem conhecimento da provável interpretação com que poderão contar das normas aplicáveis, quer para as instâncias, por forma a obter-se uma melhor aplicação do direito.

12) A relevância jurídica da questão submetida à apreciação em tal sede tem de ser de molde a causar, em geral e não no caso concreto, fortes dúvidas e probabilidade de decisões jurisprudenciais divergentes em diversos processos de natureza cível presentes nos tribunais ou ainda a suscitar forte controvérsia designadamente por ser objecto de acesos debates doutrinários ou jurisprudenciais.

13) A apreciação da relevância jurídica visa sobretudo a protecção do interesse geral na boa aplicação do direito, devendo as razões da clara necessidade de apreciação da questão ser aferidas em função da aplicação do direito em geral e não tendo presente algum caso concreto isolado.

14) Desconsiderando o caso dos autos, as questões que supra se colocaram têm sido alvo de aceso debate doutrinário e jurisprudêncial culminando na prolação das mais díspares decisões.

15) É imperioso obter um consenso jurisprudencial, que sirva de orientação quer para o cidadão comum, quer para os vários operadores judiciários, designadamente, juizes, advogados e agentes de execução, estes últimos com manifesto e intrínseco interesse jurídico na resolução cabal de tal questão, por forma a determinar cabalmente se domínio da vigência do Estatuto da Câmara dos Solicitadores aprovado pelo Decreto-Lei N° 88/2003 de 26 de Abril, sucessivamente alterado, a responsabilidade civil extracontratual dos Agentes de Execução resultante do exercício das respectivas funções profissionais e por causa delas obedece ao regime geral da responsabilidade por factos ilícitos previsto no artigo 483° e seguintes do Código Civil ou, em alternativa, ao Regime da Responsabilidade Civil do Estado e demais Entidades Públicas previsto na Lei N° 67/2007 de 31 de Dezembro e consequentemente se a competência para dirimir os pleitos relativos à mesma responsabilidade civil extracontratual cabe aos Tribunais do Foro Comum ou aos Tribunais do Foro Administrativo.

16) É extrema relevância, quer para o cidadão comum ou para as empresas, quer para os seus mandatários e demais operadores judiciários, saber com um grau de certeza razoável, se, no âmbito da vigência do supra citado Estatuto da Câmara dos Solicitadores, um caso da vida real em que se verifique a actuação ilícita de um agente de execução no exercício das suas funções profissionais e por causa delas é subsumível às regras da responsabilidade civil extracontratual geral dos artigos 483° e seguintes do Código Civil ou às normas da responsabilidade civil extracontratual do Estado, por forma a indagar se a apreciação e o reconhecimento judicial dos eventuais direitos indemnizatórios que esse cidadão ou empresa sejam titulares em virtude daquela actuação ilícita do Agente de Execução é da competência dos Tribunais do Foro Comum ou dos Tribunais do Foro Administrativo.

17) A relevância das concretas questões supra colocadas do ponto de vista da boa aplicação do direito em geral redunda, além do mais, na observância dos princípios da certeza e da segurança jurídica e da confiança dos cidadãos em geral no sistema judiciário, por forma a, por um lado, evitar a prolação de decisões surpresa e, por outro, a obter um consenso jurisprudêncial que sirva de orientação para a instauração e decisão de acções e situações futuras, 18) O que está também intrinsecamente relacionado com os princípios da celeridade e economias processuais, porquanto se o mandatário do cidadão comum tiver de antemão uma orientação jurisprudencial minimamente segura quanto ao tribunal materialmente competente para a instauração de uma determinada acção de responsabilidade civil nos termos supra expostos, evitar-se-á a instauração de novas acções motivadas por anteriores decisões de incompetência material, com as inerentes vantagens, poupanças e redução de custos e meios quer para os cidadãos em geral, quer para o Estado em particular no seu monopólio de administração da justiça; 19) O quadro legal aplicável aos autos assenta, assim, no Estatuto da Câmara dos Solicitadores aprovado pelo Decreto-Lei N° 88/2003 de 26 de Abril, alterado pela Leis N° 49/2004 de 24 de Agosto e N° 14/2006 de 26 de Abril e pelo Decreto-Lei N° 226/2008 de 20 de Novembro e demais legislação conexa, designadamente o Código Civil e o Código de Processo Civil.

20) O regime geral da responsabilidade civil...

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