Acórdão nº 052/17 de Tribunal dos Conflitos, 17 de Maio de 2018

Magistrado ResponsávelJOS
Data da Resolução17 de Maio de 2018
EmissorTribunal dos Conflitos
  1. Relatório 1.

    A………….

    - devidamente identificada nos autos - intentou no Tribunal Judicial da Comarca da Guarda [TJ] - Instância Local - Secção Cível - «acção declarativa comum» contra B…………….

    , …………, S.A., …………., S.A., e FUNDO DE RESOLUÇÃO, pedindo a sua condenação, em regime de solidariedade, a pagar-lhe o montante de 32.000,00€ a título de danos patrimoniais, acrescido de juros vencidos e vincendos, à taxa de 4%, até efectivo e integral pagamento, bem como a pagar-lhe o montante de 2.500,00€ a título de ressarcimento por danos não patrimoniais.

    1. A autora, segundo decorre da petição inicial, imputa aos réus um manancial de factos que - alegadamente - os responsabiliza solidariamente pela satisfação do dito pedido, tanto em termos de responsabilidade contratual como de responsabilidade extracontratual por conduta ilícita e culposa - violações dos deveres de informação e de lealdade.

      A primeira, porque terá celebrado em 20.09.2013 com o 2º réu, através do 1º, um «contrato de depósito bancário» - EUROAFORRO 8 - no montante de 32.000,00, que «não foi cumprido», sendo certo que na posição contratual do 2º réu está, desde Agosto de 2014, e por determinação do Banco de Portugal, o 3º réu.

      A segunda, porque a «conduta» dos réus, enquanto entidades bancárias que se sucederam, e nomeadamente através do 1º réu, funcionário das mesmas, foi ilícita, culposa, e prejudicial para a autora. O 4º réu - FUNDO DE RESOLUÇÃO - é por ela demandado também porque, diz, «é o único accionista do ……….., SA, sendo igualmente o responsável máximo pelas relações jurídicas retiradas ao ………. e entregues ao ……….., por força da medida de resolução adoptada pelo Banco de Portugal» [ponto 88 da petição inicial].

    2. Todos os demandados contestaram, sendo que o 4º réu - FUNDO DE RESOLUÇÃO - excepcionou, logo à cabeça, a incompetência absoluta do tribunal comum em razão da matéria [pontos 24 a 38 da respectiva contestação].

    3. O «Tribunal Judicial» onde a acção declarativa de condenação foi intentada - Comarca da Guarda, Instância Local, Secção Cível -, aquando do despacho saneador, julgou a jurisdição comum incompetente em razão da matéria, para apreciar e decidir o litígio, fazendo-o com a seguinte fundamentação [folhas 469 a 476 dos autos]: […] «Quanto à competência [dos Tribunais Administrativos e Fiscais], preceitua o artigo 4º, nº2, [do ETAF], que pertence à jurisdição administrativa e fiscal a competência para dirimir os litígios nos quais devam ser conjuntamente demandadas entidades públicas e particulares entre si ligadas por vínculos jurídicos de solidariedade, designadamente por terem concorrido em conjunto para a produção dos mesmos danos ou por terem celebrado entre si contrato de seguro de responsabilidade.

      Ora, é demandado em solidariedade com os demais o Fundo de Resolução que, como o próprio bem alega, é pessoa colectiva de direito público, dotada de autonomia financeira, que funciona junto do Banco de Portugal, nos termos do disposto nos nºs 1 e 2, do artigo 153º-B, do RGICSF [Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras].

      Rege-se por normas de direito administrativo, foi criado para possibilitar ao Governo Português aplicar medidas de resolução em instituições sujeitas ao Banco de Portugal, nomeadamente de transferência de activos e passivos de uma instituição de crédito para um ou mais bancos de transição para o efeito constituídos - artigos 153º-C e 145º-AB do RGICSF.

      Tais medidas, segundo o legislador, visam acautelar os interesses dos contribuintes, a confiança dos depositantes, acautelar o risco sistémico e assegurar a continuidade de serviços financeiros essenciais - artigo 145º-C.

      Foi com o intuito de zelar por esses interesses públicos que o Banco de Portugal deliberou, em 13.08.2014, aplicar a medida de resolução do …… e a criação do ………..

      Ora, ainda que a autora alegue que demanda o Fundo de Resolução na qualidade de accionista do …………, SA, extrai-se da forma como elencou e expôs a sua causa de pedir, bem como do teor das contestações apresentadas que assim não será.

      […] Concluímos que o que está verdadeiramente em causa não será o incumprimento unilateral de contrato de depósito bancário, mas, sim, a actuação dos réus em cumprimento de resoluções impostas pelo Banco de Portugal, e foi, precisamente, a diferenciação entre capitais seguros e de risco e quais eram ou não assumidos ou transferidos para o ……….., SA, de acordo com tais resoluções, que terá provocado a alegada lesão patrimonial e não patrimonial.

      Em suma, as alegadas violações do dever de informação, e lealdade, por parte dos réus, seriam inócuas para a produção dos danos, se não fossem instruções emanadas do Banco de Portugal [que, contudo não é aqui parte, o que afasta a aplicação do artigo 62º da sua Lei Orgânica e nos remete para o disposto no artigo 64º do mesmo diploma].

      Não fora as decisões administrativas, e das duas, uma: ou o montante investido pela autora permaneceria incólume e teria de ser restituído ou, ao invés, tudo se passaria como um negócio civilista comum, sujeitando-se a entidade bancária a uma condenação e eventual execução, ou, até, processo de insolvência, em que os credores reclamariam os seus créditos e seriam pagos [ou não] nos termos legais.

      Contudo, em face de tais deliberações do Banco de Portugal, alteraram-se as circunstâncias de facto e de direito, já que os passivos foram transferidos para uma outra entidade.

      Concluindo, não estamos, assim, perante um caso de natureza meramente civilista, mas antes perante relações jurídicas complexas, envolvendo entidades públicas e normas legais de direito administrativo.

      […] De notar que a causa de pedir desta acção se afigura complexa, dado que envolve contrato de natureza privada e violação de normas civis e administrativas, ou seja, o pedido indemnizatório tanto se funda em responsabilidade contratual como extracontratual.

      Mas, no que respeita concretamente ao Fundo de Resolução, a sua responsabilidade só poderá ser extracontratual, já que nenhum contrato celebrou com a autora, por violação de normas de direito administrativo, e, sendo o réu uma pessoa colectiva de direito público, são os Tribunais Administrativos e Fiscais os competentes para aferir da sua eventual responsabilidade.

      […] …os próprios interesses dos contribuintes em geral e da autora em particular, como...

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