Acórdão nº 055/13 de Tribunal dos Conflitos, 27 de Fevereiro de 2014

Magistrado ResponsávelSOUTO DE MOURA
Data da Resolução27 de Fevereiro de 2014
EmissorTribunal dos Conflitos

Conflito nº. 55/13-70.

A…….., B……, C….. e D…..

interpuseram no TRIBUNAL ADMINISTRATIVO E FISCAL DO PORTO acção administrativa comum, sob a forma ordinária, que deu origem ao Proc. n.º 1644/12.3BEPRT, contra o INSTITUTO PORTUGUÊS DO SANGUE, IP.

(doravante IPS).

O Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto declarou-se materialmente incompetente para apreciar e para decidir as pretensões formuladas pelos Autores e determinou a remessa dos autos para o TRIBUNAL DE TRABALHO DO PORTO (fls. 857 a 863), o qual, por seu turno, também declinou essa competência, vindo, em simultâneo, a considerar aquele tribunal administrativo como o competente em razão da matéria, para dirimir o litígio em causa que opõe as partes (fls. 884 a 888).

Foi solicitada, oficiosamente, pelo Tribunal de Trabalho do Porto, a resolução do presente conflito de jurisdição, ao abrigo do disposto no n.º 1 do art. 117.º do CPC, pelo que foi ordenada a remessa dos autos para este Tribunal de Conflitos (fls. 892).

  1. PARECER DO Mº Pº O Exmo. Procurador-Geral Adjunto neste Tribunal de Conflitos emitiu, a fls. 900 a 904, parecer do seguinte teor (transcrição): “1.

    Suscita-se nos presentes autos a resolução da conflito negativo de jurisdição entre o Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto e o Tribunal de Trabalho do Porto (Juízo Único, 3ª Secção), por ambos os tribunais se terem declarado incompetentes, em razão da matéria, e se atribuírem reciprocamente a competência para o julgamento da ação administrativa comum intentada pelos AA neles identificados contra o Instituto Português do Sangue, I.P.

  2. Constitui pacifico entendimento jurisprudencial e doutrinário que a competência em razão da matéria do tribunal se afere pela natureza da relação jurídica, tal como ela é configurada pelo autor na petição inicial, ou seja, no confronto entre a pretensão deduzida (pedido), independentemente do seu mérito, e os respetivos fundamentos (causa de pedir).

    Na ação em questão, os AA. pedem (1) a declaração da nulidade dos contratos de utilização celebrados entre o R. e as empresas de trabalho temporário, com quem celebraram contratos de trabalho temporário, (2) o reconhecimento aos AA. da qualidade de trabalhadores do R., ao abrigo de contratos de trabalho sem termo, (3) a declaração da ilicitude dos despedimentos/cessação dos contratos de trabalho, (4) a condenação do R. a reintegrar os AA., (5) a condenação do R. a pagar aos AA. as remunerações que deixaram de auferir desde a data dos despedimentos/cessação dos contratos de trabalho e (6) o reconhecimento da existência de créditos laborais a favor dos AA e juros de mora.

    Em síntese, os AA. fundamentam tais pedidos na inexistência do motivo que justificou a celebração dos contratos de utilização de trabalho temporário, em violação das pertinentes disposições do Código do Trabalho e da Lei nº 19/2007, de 22 de Maio, em particular do seu artº 18º e, consequentemente, na prestação ininterrupta de atividade ao serviço do R. sob o regime de contrato de trabalho sem termo, de acordo com a disposto nos art. ºs 19º, nºs 3 e 21º da mesma lei.

    A relação jurídica controvertida assim caracterizada pelos AA. na petição inicial é manifestamente regulada por normas de direito privado respeitantes ao regime do contrato de trabalho sem termo cuja existência pretendem ver reconhecida e tutelada.

    As suas pretensões emergem da alegada existência de um contrato individual de trabalho de que se arrogam ser titulares e traduzem-se no reconhecimento de direitos que a lei concede aos trabalhadores vinculados a este tipo de contrato.

    Não se mostra configurada uma relação de trabalho subordinada de natureza administrativa pois, como bem se refere na douta sentença do TAF do Porto, os AA não alegam a existência de uma relação contratual que se subsuma a qualquer norma de direito público, nomeadamente as normas que regulam o contrato de trabalho em funções públicas, em consonância com o regime jurídico aprovado pela Lei nº 12-A/2008, de 27 de fevereiro e pela Lei nº 59/2008, de 11 de setembro. Aliás, nenhum contrato de trabalho se mostra celebrado entre o R., na qualidade de entidade empregadora pública, e as AA. através do qual essa relação de natureza administrativa se pudesse ter estabelecido.

    Consequentemente, impõe-se considerar que o litígio em causa não emerge de uma relação jurídica administrativa, entendida esta como “uma relação regulada por normas de direito administrativo, que atribuam poderes de autoridade ou imponham deveres, sujeições ou limitações especiais, a todos ou alguns dos intervenientes, por razões de interesse público, que não se colocam no âmbito de relações de natureza jurídico-privada”.

    E não procederá em contrário, o entendimento perfilhado na douta sentença do Tribunal de Trabalho do Porto no sentido de que os contratos de trabalho dos AA foram convertidos sem dependência de quaisquer formalidades em contratos de trabalho em funções públicas, sendo-lhes aplicável o regime resultante das Leis nº 59/2008 e nº 12- A/2008.

    Na verdade, relevante para a questão da competência é o facto de os AA. caracterizarem o vínculo jurídico que os liga ao R. como uma relação laboral de direito privado, por via de contratos de trabalho sem termo, de que emerge a sua pretensão de...

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