Acórdão nº 3884/04.0TJCBR de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 31 de Outubro de 2006
Magistrado Responsável | JAIME FERREIRA |
Data da Resolução | 31 de Outubro de 2006 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam, em conferência, na Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra: I Nos Juízos Cíveis da Comarca de Coimbra – 2º Juízo - A...
e mulher B...
, residentes no Beco do Parreiral, nº 14, em Espadaneira, S. Martinho do Bispo, Coimbra, interpuseram contra a sociedade “C...
”, com sede em Fala, freguesia de S. Martinho do Bispo, concelho de Coimbra, a presente acção declarativa, com processo sumário, pedindo que seja declarado nulo o negócio de compra e venda do veículo que identificam, celebrado entre as partes, com a consequente condenação da Ré na substituição desse veículo por outro apto a circular e em bom estado de conservação ou, em alternativa, a restituir aos autores o montante de € 5.240,00, acrescido de juros pagos e a pagar à sociedade D...
, assim como a quantia de € 154,70 pelo arranjo cobrado pela Ré aos autores.
Para tanto e muito em resumo, alegaram que em Julho de 2003 adquiriram à Ré o veículo matrícula 74-88-HD, pelo preço de € 5.240,00, para cuja liquidação os autores contraíram um empréstimo bancário.
Que poucos dias após estarem na posse do carro constataram que o nível do óleo estava muito baixo, o que comunicaram à Ré, tendo até levado o carro às instalações desta.
Que de seguida surgiram outras anomalias no carro, designadamente com o pára-choques dianteiro que caiu, sem razão aparente, tendo posteriormente verificado-se que o dito não tinha parafusos, estando apenas encaixado.
Que dias depois o carro deixou de trabalhar, pelo que o rebocaram para as oficinas da Ré, onde foi visto e entregue aos autores passada uma semana, mas que logo no dia seguinte, quando com ele circulavam, começou a soltar labaredas do motor, o que foi extinto pelos autores.
Que outros problemas foram surgindo, sempre com o conhecimento da Ré, a qual nunca solucionou em definitivo, até que em inícios de 2004 os autores solicitaram um exame ao carro, numa oficina por eles escolhida para o efeito, onde foram informados de que o veículo padecia de diversos vícios, por ser um veículo acidentado e deficientemente consertado, o que põe em risco o comportamento e a segurança da viatura quando em circulação.
Que, por isso, os autores foram enganados pela Ré acerca do objecto do negócio havido entre as partes, pelo que têm os autores o direito a invocar a anulabilidade da compra e venda, como pedem.
II Contestou a Ré, alegando, além do mais, que no presente caso caducou o direito dos autores, uma vez que fundando os autores o seu pedido na invocação da anulabilidade do contrato por erro, cujo conhecimento reportam a 26/06/2004, tendo o contrato sido celebrado em Julho de 2003, a presente acção apenas deu entrada em juízo em 9/12/2004, tudo conforme artºs 916º, nº 2, e 917º do C. Civ.
Também impugnou os termos em que a acção foi instaurada, alegando que as “patologias” invocadas sobre o veículo pelos autores são apenas imputáveis a um filho dos ditos, face à sua condução irresponsável e agressiva, e que tiveram origem num acidente que este teve em fins de Setembro de 2003, onde embateu com a frente do lado direito do veículo, danificou a cava da roda dianteira direita, empenou o axial da direcção e soltou o radiador.
Pediu, em consequência, a sua absolvição do pedido em sede de despacho saneador ou, se assim se não entender, em sede de sentença final.
III A tal questão responderam os autores, sustentando que a arguida caducidade não se verifica, pois só em finais de Junho de 2004 é que os autores tomaram conhecimento dos alegados vícios que atribuem à viatura em causa.
Terminaram pedindo a improcedência da referida excepção, mantendo o pedido de condenação da Ré.
IV Terminados os articulados foi proferido despacho saneador, no qual foi decidido encontrarem-se satisfeitos os pressupostos processuais inerentes à tramitação da acção, tendo sido relegada para sentença final a apreciação da questão da caducidade do direito invocada pela Ré.
Aí se procedeu à selecção da matéria de facto alegada e tida como relevante para efeitos de instrução e discussão da causa.
Seguiu-se a realização da audiência de discussão e julgamento, com gravação da prova aí produzida, finda a qual foi proferida decisão sobre a matéria de facto constante da base instrutória, com indicação da respectiva fundamentação.
Proferida a sentença sobre o mérito da causa, nela foi decidido julgar a acção improcedente, com a consequente absolvição da Ré do pedido, com fundamento na verificação da caducidade do direito de acção dos autores.
V Recorreram os Autores, recurso que foi admitido como apelação e com efeito devolutivo.
Nas alegações que apresentaram, os Apelantes formularam as seguintes conclusões: 1ª - Não tendo a Ré logrado provar que fora após a compra que ocorrera qualquer acidente, e encontrando-se provado que a viatura era acidentada, existe a presunção legal de que os defeitos já existiam à data da venda, conforme estatui o artº 3º do DL nº 67/2003, de 8/4, o que não foi tido em consideração na sentença recorrida.
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- O conhecimento de tal facto por parte da Ré não pode deixar de ter-se como certo, uma vez que é comerciante de veículos automóveis, pelo que ao adquiri-los tem forçosamente de os verificar, facto aliás confirmado pelas suas próprias testemunhas, o que deveria ter sido valorado e não foi.
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- Ao vender o veículo sem condições de poder circular em segurança, sendo certo que é este o fim a que se destina, agiu dolosamente, com o intuito de enganar os autores relativamente às qualidades que assegurou e é normal existirem em qualquer veículo.
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- Logo que conhecidos alguns dos defeitos, foram estes prontamente denunciados à Ré, a qual nunca reconheceu quaisquer responsabilidades sobre as mesmas, vindo a recusar proceder à eliminação das patologias do veículo, mantendo os autores em erro sobre as verdadeiras enfermidades do mesmo, razão pela qual mandaram proceder às averiguações necessárias sobre aquelas realidades, nomeadamente requerendo a peritagem da E...
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- Só após o recebimento do relatório daquela entidade, os Autores procuraram saber o historial da viatura, vindo a tomar conhecimento em 26/6/2004 de que, nomeadamente, o carro já havia tido pelo menos três proprietários antes deles, contrariamente ao que lhes tinha sido assegurado, e que era ter tido apenas uma única proprietária, o que a prova testemunhal e documental comprova, pese embora o Tribunal “a quo” o não tenha assim entendido.
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- Na sentença...
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